24 de junho de 2008

Ken Park


Filmes que expõem as mazelas de nossa sociedade hipócrita, escancaram suas entranhas e escandalizam os mais puritanos me atraem em particular. Independente da qualidade, passível de ser criticada como em qualquer filme, gosto da iniciativa de diretores que têm a coragem de pôr a mão na ferida, de causar aquela sensação incômoda no espectador ao depará-lo com a realidade nua e crua que muitos preferem ignorar. Larry Clark, de Kids e Bully, é um desses cineastas que sabem causar desconforto e, ainda, imprimir qualidade a suas produções. Mas se você acha que já viu tudo em matéria de crueza, prepare-se para Ken Park. Para ser ter uma idéia, quando foi exibido no Festival de Veneza em 2002, muitos críticos se recusaram sequer a vê-lo. Durante sua projeção, em diversos lugares do mundo, a cena se repetia: espectadores ofendidos deixando a sessão pela metade. Alguns países nem ao menos cogitaram sua exibição, mesmo que para o público adulto.Ken Park, exibido por aqui nas mostras do Rio e São Paulo há alguns anos, chegou nos cinemas e, quem tive a oportunidade e estômago para vê-lo, entendeu o porquê de toda essa polêmica em torno do filme. Clark volta a abordar as idiossincrasias dos adolescentes problemáticos, mas vai além ao usar sexo explícito para contar a história de quatro jovens perdidos numa sociedade que os rejeita ou é rejeitada por eles. São eles Shawn (James Bullard), que transa com a mãe da namorada; Claude (Stephen Jasso), um jovem apaixonado por skate oprimido pelo pai beberrão; Tate (James Ransone), que convive com os avós a quem odeia e maltrata; e Peaches (Tiffany Limos), uma garota obrigada a lidar com o pai viúvo e fanático religioso. Todos eles conheciam de vista Ken Park, garoto suburbano que comete suicídio logo no início da fita, dá nome ao filme, mas pouco tem a ver com a narrativa. Apenas no final descobrimos os motivos que o levaram a se matar.Definir Ken Park não é tarefa fácil. Bom? Ruim? Mediano? Isto depende muito da tolerância de cada espectador. Clark não faz concessões, não é parcimonioso em nenhum momento. Ao contrário, o filme prodigaliza cenas de sexo entre os adolescentes (na verdade, adultos bem caracterizados): oral, ménage à trois, sadomasoquismo. Tudo explícito, com closes generosos tanto nas genitálias femininas quanto nas masculinas. Algumas cenas causam repugnância e soam propositadamente gratuitas, como a do personagem Tate se masturbando e se auto-asfixiando enquanto ouve uma jogadora de tênis arfar durante um jogo transmitido pela TV. Se Ken Park fosse o primeiro longa de Clark, poderíamos acusá-lo sem pestanejar de gratuidade com o objetivo claro de chocar. Mas o diretor já deu mostras anteriores de que é capaz de não sucumbir a este expediente para conseguir chamar a atenção. Na verdade, ao meu ver, ele fez uma espécie de caricatura de uma juventude perdida em seu próprio tempo. Há exagero, mas há também verdade e honestidade em seu filme. Na tela, além de sexo, o que se vê é uma crítica ácida ao modo como as pessoas costumam enfrentar as frustrações da vida. Os adultos dissimulando as suas e deixando os jovens sem referências para lidarem com as deles. O resultado pode ser...Ken Park.

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